O Samba Espacial e Especial de Dona Flor e Seus Dois Maridos



A história da banda Dona Flor e Seus Dois Maridos começou numa noite abafada de verão em Salvador, no quintal de uma antiga casa azul no bairro do Rio Vermelho. Ali morava Flor, professora de literatura e percussionista nas horas vagas, que costumava reunir amigos para discutir livros, tocar e rir das próprias desgraças.

Numa dessas noites, depois de uma leitura coletiva de Dona Flor e Seus Dois Maridos, de Jorge Amado, a luz acabou — e o som dos mosquitos competia com o batuque improvisado nos baldes e panelas. Foi então que Flor teve um estalo:
— E se a gente formasse uma banda com esse nome? Uma banda que misturasse amor, caos e ressaca social, igual à vida?

A turma caiu na gargalhada, mas a ideia pegou fogo. Entre os presentes, estavam músicos e artistas de diferentes cantos do Brasil: dois irmãos de Recife que tocavam guitarra e saxofone; uma baixista carioca que fazia performance em praça pública; um baterista gaúcho apaixonado por samba-rock; uma tecladista com formação clássica que largara a orquestra para tocar em bares; e um vocalista com alma de palhaço, fã confesso dos Mamonas Assassinas e de David Bowie.

O grupo começou tocando em festas universitárias, misturando MPB, rock, samba e funk com letras cheias de ironia e crítica social. Em suas músicas, falavam sobre amores líquidos, aluguel atrasado, racismo, a correria da vida urbana e o desejo de dançar mesmo quando tudo desaba.

O sucesso veio quando uma gravação caseira de “Flor, Marido e o Sistema Solar” — um samba psicodélico sobre poliamor e capitalismo — viralizou nas redes. O clipe mostrava a banda inteira dançando com fantasias de planetas feitos de papelão, rodando como um sistema solar desajustado.

Desde então, Dona Flor e Seus Dois Maridos virou símbolo de um novo tipo de música brasileira: debochada, poética e profundamente humana. Oito pessoas, quatro tons de pele, infinitas camadas de som — e uma certeza: o amor, o riso e o batuque sempre cabem no mesmo compasso.

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