OS IMORTAIS
Dos vales terrenos
Chega até nós o anseio da vida:
Impulso desordenado, ébria exuberância,
Sangrento aroma de repastos fúnebres.
São os espasmos de gozo, ambições sem termo,
Mãos de assassinos, de usuários, de santos,
O enxame humano fustigado pela angústia e pelo prazer.
Lança vapores asfixiantes e pútridos, crus e cálidos,
Respira beatitude e ânsia insopitada,
Manobra a guerra e faz fugir as artes puras,
Adorna de ilusões a casa do pecado,
Arrasta-se, consome-se, prostitui-se todo
Nas alegrias de seu mundo infantil;
Ergue-se em ondas ao encalço de qualquer novidade
Para de novo retombar na lama.
Já nós vivemos
No gelo etéreo transluminado de estrelas;
Não conhecemos os dias nem as horas,
Não temos sexos nem idades.
Vossos pecados e angústias,
Vossos crimes e lascivos gozos,
São para nós um espetáculo como o girar dos sóis.
Cada dia é para nós o mais longo.
Debruçados tranqüilos sobre vossas vidas,
Contemplamos serenos as estrelas que giram,
Respiramos o inverno do mundo sideral;
Somos amigos do dragão celeste:
Fria e imutável é nossa eterna essência,
Frígido e astral o nosso eterno riso.
Harry, personagem de Hermann Hesse (escritor alemão) em "O Lobo da Estepe", edição de 2009.
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